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Mulher

 

foto Gilberto Rodrigues

 

Um poema escrito a partir da perspectiva do poeta buscando entender a demanda  da mulher em uma relação de paixão.

Estar apaixonada é buscar o reconhecimento nos olhos do amado e construir-se para jamais deixar de obter aquele olhar terno e encantador.

Clique aqui para ouvir:

http://youtu.be/mRZl_iwjRJ4

  • Data: 12 nov 2011
  • Em: Poemas
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7 dias de castigo

Crônica

(c) Tomado de http://data1.blog.deEstou a menos de quatro anos de tornar-me um sexagenário. Já estou pelas abas da proteção da lei do idoso. A qual não posso recorrer agora, apesar da minha indignação. Não tenho lá muitos cabelos brancos, ainda, mas os poucos que escorrem entre tantos outros me fazem lembrar já longínquos tempos, relembrar estripulias, paixões, lugares e comportamentos. Achava eu (quem mandou achar? – De achar morreu um burro, diria meu pai) encontrar-me já livre da possibilidade de ser submetido a muitas coisas que eram até comuns na infância, até na adolescência, como ficar de castigo, por exemplo. Só achava, pois estou de castigo. Sete dias. É isso mesmo! Sete dias de castigo. Impedido de buscar amigos novos, de relacionar-me, de ampliar meus relacionamentos, rever velhas e saudosas relembranças… Não sei descrever o que estou sentindo. Vergonha? Constrangimento? Sinto-me humilhado? Um pouco de tudo isso. É estranha essa sensação porque talvez não me imaginasse mais sendo posto de castigo. Ainda mais de uma forma tão fria, brusca e insensível. Mas não para aí: não tenho a quem recorrer. Não há a quem possa levar minhas razões, meus argumentos, minhas justificativas. Estou totalmente impotente, vendo-me sem alternativas, além de cumprir a sentença anunciada. Que coisa mais absurda! Como alguém ousa tanto: você está de castigo e pronto. Tamanho autoritarismo faria morrer de inveja o mais cruel dos ditadores, a esposa mais enciumada, o marido mais culpado e até o adolescente que acabou de vestir suas primeiras calças compridas. Ah, e tem mais: há um complemento no enunciado do castigo: se você não for obediente este tempo poderá ser aumentado. Isso é ameaça! Imagina… Estou sendo castigado, ameaçado, tendo meu direito de defesa cerceado e não posso fazer absolutamente nada. Agora, em pleno século XXI isto acontece, assim, sem cerimônias, comigo, cidadão honesto, honrado, impostos recolhidos, contas em dia,  trabalhador, estudioso… Não adianta greve de fome, convocar um bando de desocupados para solidarizarem-se comigo numa barricada, fazer um abaixo-assinado, invadir o palácio da rainha, nada, nada há o que possa ser feito. Estou condenado irremediavelmente, e sem direito de defesa, ao meu castigo.
Porém, não é a indignação do castigo de sete dias o que me causa espécie. É o estarrecimento quanto ao que nos acontece. Seria isso argumento de alguém que já passou dos cinqüenta? Espero que não.
Eu tenho amigos de longa data espalhados por este país. Já fiz andanças pelo mundo da viola, conheci violeiros, cantadores, e apreciadores chãos afora. Além de tudo isso carrego muitos preconceitos, alguns mais radicais, outros mais brandos, mas preconceitos. E sempre ouvi dizer que isso não dá certo, que não é politicamente correto, então sempre tento rever meus conceitos e ir me acertando no cotidiano que está aí pra ser vivido. Tempos atrás, tempo pouco, apareceu no nosso meio esse tal de face book. Garrei com meus preconceitos: isso é coisa de desocupado, de quem não tem o que fazer, só tem bobagem, é só fofoca, fica todo mundo se expondo e o resto fica de curioso sobre as exposições alheias. Eu? Adicionar você? Não sei o que é isso e nem quero saber. Vê lá se alguém com minha cultura, meu nível social, meu reconhecimento profissional vai estar vinculado a esse tipo de coisa? Então, até para não ficar tão fora do mundo “eletronizado” resolvi montar um blog. Vou postar lá meus poemas, minhas resenhas, artigos, entrevistas, crônicas, fotografias, etc. Analfabeto que sou, chamei um colega pra me dar uma mãozinha. Veio. Viu. Gostou do que viu e sugeriu: por que você não abre uma página no face book? Vai ajudar você a divulgar seu trabalho, seu blog. Eu? Nem pensar! E já desfiei meus argumentos… Ele, pacientemente, deixou-me terminar todos aqueles absurdos e disse-me: olha o face é apenas uma ferramenta. Se vai ser algo produtivo ou fútil, para fofocas ou para trocas de idéias, se vai ser sério ou não, vai depender de quem o usará. Calei-me. Quanta asneira havia sustentado com ares de sabedoria e profundo conhecimento. Abri minha página no face.  Comi melado. Lambuzei-me inteiro. Vi ali pessoas incríveis. Adicionaram-me pessoas da maior importância do mundo das letras, das ciências jurídicas, da psicanálise, da psicologia, da música, da moda de viola, parentes e amigos de outrora. Estava encantado. E envergonhado. Quanto preconceito idiota. Aliás, todo preconceito é idiota. Fui adicionar mais pessoas. Era de uma riqueza aquele mundo que me vi criança solta para o mundo pela primeira vez. Veio o primeiro aviso: Só adicione se conhecer, pessoalmente. Já havia adicionado muitos que não conhecia pessoalmente, mas não era o caso. Esse eu conhecia pessoalmente. Não sei se não fui reconhecido, mas como era pra eu tentar: tentei. Afinal o conhecia. Outro aviso… Terceiro aviso – lembrei-me de minha mãe: não vou falar de novo. Tentei. Mensagem: você, por sete dias, não poderá adicionar mais ninguém e se alguém disser que não te conhece este tempo poderá ser aumentado. Mais nada. Pronto. Estou eu de castigo.
Aproveito esse tempo para refletir um pouco. Às vezes me meto a embrenhar-me pelos meandros da reflexão.  Ficar de castigo no face não chega a ser algo que me incomoda. Afinal, coagido à obediência, cumpro minha pena até o próximo final de semana. Mas, e isto chega a vias de tirar-me o sono, surgiu deste pequeno e aparentemente insignificante incidente uma questão: daqui a alguns anos – décadas parecem-me já coisa longe para as evoluções da informática – o que será que a máquina estará controlando em nossas vidas? Que penalidades estarão as máquinas me impondo sem dar-me oportunidade para recursos ou contra argumentos?  Afinal o Grande Irmão deixou o mundo da ficção. Ele “zela e observa todos nós”. Tenho medo. Muito medo de que de fato a máquina, em futuro próximo, ou já num presente que ignoro se sobreponha sobre nossas ações, sobre até mesmo nossos pensamentos. Lembro-me dos meus tempos de seminário onde os pecados do pensamento também deveriam ser confessados. E o pior é que estes recebiam as penitências mais contundentes. Voltando ao castigo: Cumprirei este castigo imposto pelo face mas atento aos cochichos que as máquinas já andam fazendo pelas esquinas, de soslaio, de esguelha em nossas casas, nos cantos das escolas, nas sacristias das igrejas. Não temo errar, mas gostaria de poder estar contando com uma possibilidade de mostrar minhas razões, minhas intenções e meu coração. Meu coração ainda não é de lata e não tenho chips implantado em meu cérebro. Vou parar… Meu PC está emitindo um ruído estranho. Não sei decifrar esta mensagem. Desligo. Não quero ser castigado por outro viés da minha ignorância.

Taubaté, SP, 06 de novembro de 2011  

Nota: Foto retirada de: (c) Tomado de http://data1.blog.de

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Entrevista, tema: Perdas

Entrevista concedida à Jornalista Michelle Sampaio para o programa Vanguarda Comunidade – Exibido em 06/02/2011. Emissora: TV Vanguarda, Taubaté.

Confira as questões que foram abordadas nesta entrevista:

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Dia de Finados!

foto Gilberto Rodrigues

Hoje é dia de finados. Dia em que rememoramos entes queridos que já nos deixaram. É um dia em que pesa a perda física de pessoas queridas. Mas a morte vai além das perdas materiais, físicas. Há a morte necessária. Aquela que é preciso realizar-se para que o novo  floresça. A morte do quotidiano, a morte simbólica. Aos que já morreram e principalmente aos que optam e se enchem de coragem para realizarem no dia-a-dia a morte do que deverá ser um dia apenas relembranças, posto dois poemas… A morte trás dores, mas alegrias também… Tudo é assim.

Vida entre mortes

 A vida que importa
é a que a morte comporta
entre o seu começo
e o seu fim.
Resistir à morte
é insistir para que a vida
seja breve.
A lagarta
se insistir na vida
 rouba a borboleta
no seu tempo de voar.

[foto do casulo: jochamaeu.blogspot.com]

 

Revivência

 
Por que oh morte
tão tarde me visitaste ?
No encontro de derradeiras vistas
passo em revista
o que fiz e o que não fiz.
Também o que poderia
ter ou não ter feito.
Depois de ti oh morte
que de cruel e temível
em ti nada encontro
reordeno meu destino
dissipo-me dos meus sonhos
para que contigo sempre presente
eu possa viver intensamente
o que me faz estar vivo.
Tive muitas lutas pela vida.
Outras tantas para evitá-la
e agora me aconchego
no espaço do funeral
do que imaginei ser
para revigorar-me para a vida
e redescobrir-me
entre a vida e a morte.
Por que em tua visita trouxeste-me
a fragilidade de tantas intenções
a inutilidade de tantas batalhas
o desperdício de tantas lutas?
Penitencio-me diante de ti
para redimir comigo do meu passado.
As intenções foram tantas
que muito tempo será pouco tempo
para uma confissão final.
Conceda-me eu lhe peço
um segundo a mais
para que eu me vista a rigor
para poder por inteiro
deixar-me por ti ser levado.
Pronto. Eu estou pronto.
Toma a minha mão e conduza-me
para os teus caminhos.
Leva-me já.
A vida já está a minha espera.
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Gravaralistas

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foto Gilberto RodriguesHoje eu estava pensando…

Com que gravata iria
ao seu funeral?
Nunca fui a um funeral…
Teria mais prazer em enterrar
os mortos vivos.
Aqueles que ainda andam
comem, bebem e dormem. Só.
Mas, e se você não morrer
que farei com a minha gravata?
 
Talvez possa usá-la como alça
para aquele seu retrato empoeirado
e amarelecido há cem anos.
Vítima da necessidade de ser vítima.
Poderei morrer primeiro.
Queria ser incinerado
mas para não perder aquela gravata
pediria que me enterrassem com ela.
Ela não constará de testamento algum.
Ela é a gravata do nó da garganta
do pranto não chorado.
Eu não iria ao seu funeral.

Ensina-me a comer!

foto Gilberto Rodrigues

Crônica

 

Acabei de sair do consultório da minha nutricionista. Ufa! Que alívio. Por quê? Há tempos fugia dela. Quanto arrependimento! Há cinco meses tive uma “complicação” cardíaca, fui pro hospital, fiz cateterismo, meu irmão avisou meus familiares e dois dias depois saí. Eu estava bem. Os exames me liberaram. Aliás, esses exames! Mas aí começou um patrulhamento implacável e com certeza bem orquestrado, para não me deixar com dúvida alguma sobre o que eu deveria fazer daí em diante. O cardiologista disse que eu deveria perder 40 quilos. Meus filhos que eu não poderia mais beber. O amigo que eu deveria matricular-me na academia. Minha mãe preocupava-se se eu ainda fumava ou se havia parado. Meus irmãos que eu tinha que mudar meus hábitos alimentares. Minha ajudante aqui de casa que eu deveria dormir mais. Minha namorada que eu deveria tirar férias e trabalhar menos. Minha chefa na escola onde dou aulas que eu deveria descansar porque o cansaço afeta a memória. E eu acuado não sabia o que fazer, mas sabia que tinha que fazer alguma coisa porque qualquer coisa que me ocorresse doravante, até mesmo um óbito, seria de inteira responsabilidade da minha displicência. Eu parei de fumar, diminuí a ingestão alcoólica, matriculei-me na academia, aumentei as folhas do almoço, colori a salada, comprei mais algumas frutas e… Nossa! Quanto sacrifício. Acho que já dá pra perceber que estou me empenhando. Que nada.

E a nutricionista, já marcou? Já foi a nutricionista? Quer que eu marque a nutricionista? Eu já falei com minha nutricionista e ela está te esperando… Eu escapava: Vou marcar. Estou arrumando umas coisas óbvias antes… Deixa-me parar de fumar primeiro… Espera pra eu me adaptar a ausência do álcool… Mas, em vão. E tudo de novo: E a nutricionista, já marcou? … Vou poupá-lo caro leitor, não quero que passe pelo que passei. Uma repetição interminável. E tudo para o meu bem. Era por amor, eu sei, mas repetiam. Nunca me senti tão amado.

E lá vem o destino fazer coro aos meus amores. Num posto de gasolina encontro-me desavisadamente com a nutricionista. Puxou-me as orelhas e ali mesmo já teve início a sedução: Agora é diferente,os conceitos mudaram, etc. etc. etc. Eu lhe falei de minhas tentativas fracassadas de agendamento, expliquei, justifiquei, disse-lhe que estava me acertando, que estava bem, mas de nada adiantaram meus argumentos. Dê-me seu telefone, ela disse. Agora danou-se, pensei.

Fui para casa injuriado. Já conhecia aquela nutricionista de outros tempos. À noite sonhei com calorias, tropecei na balança, me enrosquei na fita métrica e vi um prato de verduras com um bife grelhado acenando pra mim… Por outro lado alfaces me perseguiam, torresmos debochavam de mim, os ingredientes da feijoada faziam orgia sobre a mesa, a leitoa a pururuca ameaçava sair do forno, minhas cachaças comemoravam sem mim, as latinhas de cerveja batucavam em festa.  Se veriam livres do meu apetite.

Alô!Sim , entendi, estou indo. E num é que ela arrumou um buraco na agenda dela pra mim. Fui. Não fosse pra ver. Duas horas e meia de consulta. Que arrependimento por não ter ido antes, por ter relutado tanto. O conceito de dieta mudara mesmo. Se eu comer tudo e na quantidade que ela sugeriu com certeza vou engordar. Certifiquei-me se ela havia compreendido bem que eu deveria emagrecer e não engordar. Ela garantiu-me que sim. Vou ter uma ração diária maior, mais saborosa e mais saudável que aquela que vinha tendo há anos. A não ser nas extravagâncias regadas a uma boa cachaça e cerveja gelada. E ela, pacientemente, explicava-me: engordamos porque comemos pouco e então nosso organismo precisa guardar o máximo possível de nutrientes para dar conta de nossas atividades, da nossa sobrevivência. Emagreceremos se comermos bem e de forma saudável, pois assim o nosso organismo sinalizará para o nosso cérebro informando-lhe que não precisa guardar nada, não precisa fazer estoques, pois o estamos abastecendo sempre e corretamente. Pensei comigo: tem lógica. Faz sentido.

Comecei hoje minha dieta. Ela disse-me que se a seguir certinho em seis meses pesarei vinte quilos a menos. Mas eu confesso: não é nem pelos vinte quilos a menos que me empenharei. O coro dos que me gostam me venceu e convenceu. E eu quero continuar me sentindo gostado, mas sem aquele patrulhamento. Meu coração também é muito grato. Vou ser um ser saudável, sem me preocupar com calorias… Isso não é inacreditável!

Tbt, 20/10/2011

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A Arte em desabrigo

 Crônica

 

Escultura do Jeca Tatu feita em nov/99, pelos escultores Raymundo Ribeiro, Aristeu Monteiro e Marcos Gomes localizada na Praça Dr Barbosa de Oliveira, Taubaté, SP, e está sendo carcomida pelo tempo devido ao descuido das autoridades públicas que não cuidam do que está relacionado à arte. Cuidar da arte e da cultura não gera dividendos financeiros nem eleitoreiros. Conscientiza e pessoas conscientes não interessam a quem só quer o poder. Foto Gilberto Rodrigues

É o começo de uma tarde de sábado. Ensolarada. Ainda é primavera, tempo ameno, saudável. A quentura não é incômoda. Fico pensando… Além dos shoppings centers, para onde podemos convidar alguém para assistir a um filme? Para os cinemas seria a resposta óbvia se todos eles não tivessem se transformado em templos de igrejas protestantes. Mas o que me leva, em plena tarde de sábado, a questionar uma coisa já tão sabida? Tão óbvia?

Explico. É que acabei de voltar da cidade de Pindamonhangaba, onde fui ver o que aproveitava do espólio da biblioteca da Faculdade de Música da cidade. É isto mesmo. A Faculdade fechou e sua biblioteca está aberta para quem quiser ir até lá e comprar o que lhe parecer interessante. Livros de história da música a 10,00. CDs a 1,00. Não questiono as razões que levaram ao fechamento da Faculdade. Enquanto escrevo escuto Mário de Andrade cantado por Teca Calazans. Ouço José Maurício Nunes Garcia, Maura Moreira, Pixinguinha, Villa-Lobos, Patápio Silva, Luizinho Eça. Estavam lá… Para serem levados, para liberar o espaço do que fora um dia uma biblioteca de uma Faculdade de Música.
A cena é esquisita. Para quem é acostumado ao silêncio, à ordem, ao cuidado que se tem em uma biblioteca é muito estranho ver aquela desordem, aquele mundo onde cada qual trata com indiferença o que não lhe interessa levar. Aquela deferência aos livros que sempre teve quem neles aprendeu alguma coisa, ou muita coisa, ou tudo o que sabe, ou com eles viajou mundos reais, imaginários ou simbólicos, ali não existia. Quisera levar tudo, todos. Levá-los para cuidar deles. Trouxe alguns. Espero que cuide dos outros, quem os levou.
Fico pensando na superficialidade com que o mundo tem tratado o que é profundo. A música é algo profundo. Toda Arte é profunda. Parece que não há mais tempo para que as coisas profundas do mundo, da vida, sejam curtidas, maturem, descansem para depois florescerem, desabrocharem, penderem em frutos e produzir sementes donde desabrochará algo novo. E com potenciais de profundidade. A superficialidade fugaz de cada coisa, a descartabilidade de todas as coisas, parece-me, torna-se mais atraente, mais interessante além de não causar incômodo algum se perdidas, afinal o que valem mesmo? Nada. Uma biblioteca, livros, discos, filmes, quadros, ilustrações, artesanatos, esculturas, provocam reflexões, discussões, dúvidas. Respondem nunca nada. E isso é encantador, é fascinante. Sedutor. Seria essa a razão de seu desaparecimento? Não querem mais os moços e as moças destes tempos pensar, ficar em dúvidas, refletir? Será que é saudosismo piegas lamentar o fechamento de uma biblioteca? E olhe que não é uma biblioteca qualquer – é a biblioteca de uma Faculdade de Música! Pieguice ou não, lamento sim o fechamento de tantas das nossas salas de cinema, de nossos clubes de leitura, de bibliotecas.
Continuo a pensar… Livros cada vez mais cansam. Ler cada vez mais é incômodo, dizem quem nunca leu um clássico – Érico Veríssimo, Drummond, Victor Hugo, Cecília Meireles, Euclides da Cunha, João Cabral de Mello Neto, Bandeira, Gullar, Mario de Andrade, etc. Ouvir músicas está cada vez mais démodé – sim, ouvir música como atividade principal, com a veneração que ela pede, quando você fica ali, naquele lugar, só para ouvir, apreciar, degustar, saborear – e não música como um barulho qualquer enquanto se desvencilha uma atividade qualquer, para um resultado qualquer. Como será vista hoje uma pessoa que disser que deseja fazer uma faculdade de música? Será que com os mesmos olhos com os quais se olharia alguém que desejasse fazer medicina, direito, engenharia, ou outra que tem uma promessa de emprego certo e um bom salário já mesmo antes do seu término?

... assim os livros estavam lá, esperando quem os quisesse levar...

Há algo errado. Onde? O que está errado? A literatura hoje é lida em resumos de clássicos. Estes não servem nem para segurar a porta aos ventos, pois dão traça. Nem para enfeitar estantes, pois não são olhados como algo que enfeita, mas como algo que junta pó, dá alergia. Qual é o lugar que reserva o mundo de hoje para os artistas? – pintores, poetas, músicos, escritores, ilustradores, artesãos, escultores e outros fazedores de Arte. – Naturalmente falo dos bons. Daqueles que têm consistência, conteúdo, uma história pra contar, algo para acrescentar a cada um de nós que os apreciarem. Daqueles que não foram construídos na frivolidade  do sucesso fugaz. Eles têm ainda um lugar, ou estão sobrando pra eles apenas cômodos apertados em nossas casas, cantos particulares, pois a coisa pública está cada vez mais sustentada no verniz da inconseqüência e do descaso com a Arte de modo geral?

É. É assim mesmo que estou me sentindo… Desolado e com raiva. Atônito. Perdido. Deslocado. Desentendido deste lugar onde me encontro. Ainda gosto de livros, de uma boa música, de fazer poesia, de ler as crônicas da Cecília Meireles ou da Martha Medeiros. De ouvir um Villa-Lobos ou um Milton Nascimento. Ou viajar numa viola caipira tocada por um Roberto Corrêa ou um Renato Andrade.
Entristecido, desolado, recolho-me em meu desconsolo por ver situações como esta acontecendo com toda a indiferença que é capaz de ter o ser humano que está preocupado, neste sábado, em apenas aproveitar as promoções que fazem as lojas por ocasião do dia das crianças.
Vou fazer poemas. Ouvir músicas. Semana que vem há um feriado, mas poucos o aproveitarão para construírem uma questão sobre o significado do mundo da Arte, afinal este mundo da arte é trabalhoso e ainda não é descartável. Quando somos tocados por ele temos que nos haver com ele, que dar conta dele, e, por conseqüência, de nós mesmos…
Agora vou limpar e guardar os discos e os livros que trouxe da biblioteca que fechou.
 08.10.2011
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Liberdade

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foto Gilberto Rodrigues

 

 

 

 

 

A todos os povos que ainda não esqueceram

A maravilhosa arte de lutar pela LIBERDADE

 

 
Eu queria gritar o canto
Que se encontra
Estancado em meu peito.
Já é hora
O povo espera,
O sistema insiste.
Porém eu creio,
A angústia é mais forte.
 
            TRABALHADORES, INTELECTUAIS,
            LIBERAIS E ESTUDANTES:
            Individualmente nosso desejo
            É batalha perdida.
            É preciso que a causa seja Nacional
            Porque a dor que leva à morte,
            Ou nos faz calar,
            É um convite à Luta.
 
Deixar morrer o corpo
Para sentir a liberdade do peito ou da voz
Daqueles que emudeceram
Será feito sem receios
Se for necessário. QUE VIVA A LIBERDADE.
 
Calar o peito ou a voz
Para permitir que o corpo
Seja arrastado por caminhos afora
É massacrar o desejo
Que brota inocente
No coração de nossos filhos.

SEM CASTIGO A VIDA CESSA

foto Gilberto Rodrigues

Povos que se arrodeiam de mim
Não fechem os olhos lhes suplico
Para os crimes que cometo dia-a-dia
 
Há crimes que ceifam a vida
A criatividade e o novo
Não é esse o crime que canto
Encanta-me o outro crime
Que traz pleno em seu bojo
A marca implacável da morte
Como prenúncio de vida nova
 
Como posso ousar transgredir
Subverter se certeza eu não tiver
De que pelo fato feito
Se crime vir-a-ser
Eu receba sem dó nem compaixão
Sem raivas nem vingança
Mas com presteza e
Sem parcimônia
E tão somente por ser correto
O castigo que então julgado a mim couber
Pelo dano provocado pelo crime feito
 
A certeza do castigo líquido
Liberta-me para viver segundo eu mesmo
Para incriminar-me sem remorsos
Após ter-me visto indignado e pasmo
Diante das concessões e das permissões
Dos homens pobres e lesos
Para que homens vivam ou morram…
 
Por onde andará então pergunto
A crua possibilidade
Do livre vir-a-ser
Oh! Homens das leis
Magistrados e legisladores
Dignos promotores da nossa indigna sociedade
Não ponham as leis sob mim
Nem menosprezem minha torpeza de caráter
Nem meus genes de sobrevida
Que me lançam a morte pelas próprias vidas
 
Condenem-me a cada nova transgressão
Mas não me matem pela possibilidade de fugir
Se não fujo não creiam em consciência
Não é por julgar-me inocente
Que fico estanque
Mas tão somente porque minh’alma
Contaminada de forma irreversível
Por sonhos de liberdade plena
E idealismo de vidas livres
Precisa ter a certeza do castigo inconteste
 
Sendo livre e digna minha sociedade
Encarregar-se-á de impingir-me preciso crer
Tão logo eu transgrida as suas normas
Aquelas ordens rotas imbecis e já mortas
Das frias letras nas lápides dos códigos e das leis
Como mortos são todos
Os princípios de nós mesmos
 
Por isso tenho que transgredi-los outra vez:
Para que ressuscitem dentre tantas mortes
Ah! Creiam
Somente a certeza do castigo certo
Me deixará plenamente liberto
Para que crimes insensatos
Querendo ver crescer todas as gentes
Eu possa cometer inconseqüente
Para a remissão da humanidade
 
Oh! Homens ou Deuses que traçam
Ou trançam os rumos dos povos
Não eliminem da nossa lida cotidiana
O castigo que nos liberta
Do crime que se comete
Por matar a velha vida nossa
Para criar e poder viver
Quem sabe uma vida nova
 
Os castigos são necessários
Para libertar todos os homens
Dos crimes que eles cometem
Para que então saboreando a liberdade
Possam novamente novos crimes
Nunca ter medo de cometer.
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