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O adulto é filho da criança!

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Estamos num mês onde os preparativos para a volta as aulas mobiliza toda a nossa sociedade. Escolas sendo reformadas para receber alunos, pais se organizando para seus filhos irem a escola, meios de transportes se preparando para facilitar a vida dos pais…

Olho para tudo isso e me pergunto: Estão pensando de fato no processo de educação de nossas crianças, ou tudo isso é para facilitar a vida dos adultos? Financeiramente para os empresários da educação, funcionalmente para os transportadores de crianças – afinal é uma frente significativa de empregos -, e para os pais, além de proporcionar-lhes a sensação de que estão fazendo o melhor para seus filhos, é um tempo que sabem, podem trabalhar ou agendar alguns compromissos pessoais, pois os filhos estão na escola. Continuo pensando, temendo estar enganado: num deve ser só isso… Continuo refletindo sobre o que é educar as crianças para o mundo: penso que é buscar capacitá-las, sem mutilá-las naquilo de mais peculiar que possuem – a sua autenticidade -, para se adequarem ao mundo civilizado. Não necessariamente para o mundo como nós, os adultos, o desenhamos, ou para este mundo com o qual nos conformamos. Ao não deixarmos a criança aprender, ao impedí-la de descobrir, porque queremos ensiná-la no nosso tempo e do nosso modo não estamos permitindo o desenvolvimento de sua capacidade de pensar, de se posicionar no mundo, de desabrochar-se enquanto sujeito pensante, singular e único, cada qual conforme suas peculiaridades, habilidades e aptidões. É, deve ser isso educar. Deveria ser assim… É? Então…

O problema é  que diante de todo esse estardalhaço de volta as aulas não consigo deixar de perceber que há uma cumplicidade, um pacto, entre pais e educadores com relação às nossas crianças, os pais dos adultos de amanhã. Aqueles adultos serão conseqüência das crianças de hoje. E essa cumplicidade visa o que? – com as exceções que justificam a regra – visa uma criança totalmente adaptada. Aí eu me entristeço porque o que vejo é mais que isso. É a busca de uma criança submissa, subjugada, obediente, que não dê trabalho, que não acarrete problemas na escola, que não dê problema em casa e que nas comparações de praxe não sejam diferentes dos filhos do vizinho, ou do amigo, principalmente se o temos na conta de bem sucedido socialmente. – quanta pobreza!-. E para que isso aconteça o sistema educacional moderno, apesar de todo um discurso que cria, diferente disso que falo, mutila, com o aval – diria até com a conivência e cobrança dos pais-, aquelas crianças que fogem da “normalidade“. A criatividade, a originalidade, o novo, o inusitado não pode acontecer ou tem que ser deixado para as secundárias atividades extra-curriculares. A singularidade do sujeito, sua individualidade torna-se incômodo. As diferenças tornam-se motivo para a busca de um diagnóstico profissional  onde psicólogos, pedagogos, psicopedagogos, neurologistas, psiquiatras, são convocados para explicarem as  diferenças, que justifiquem, que acalme  a sensação de incompetência que estas diferenças individuais provocam nas instituições de ensino, nos pais, nos parentes. Mas, se avalizados por todos considerados competentes, coitada da criança, o problema tem que ser ela mesmo, não é assim? Nunca vi pais ou professores sendo encaminhados, para uma avaliação sobre sua adequação ou inadequação para lidarem com crianças. A sensação de incompetência decorre, então, do fato de se prepararem tão somente para lidar com o mesmo, com o igual,  com o “normal“. Coitadas das crianças que por serem privilegiadas, possuírem algum dom, alguma peculiaridade, uma sensibilidade diferenciada, terem um modo de olhar o mundo um pouco diferente do modo convencional, têm que enfrentar uma escola. Se ela resiste tanto ao enquadramento, apesar de todos os malabarismos e medidas – as vezes até folclóricas e cômicas – que são tentadas, deve ser ela mesmo o problema, dizem.  Mas quem pergunta, quem ousa perguntar sobre o que está tão indigesto pra aquela criança? E eu fico mais triste ainda quando pergunto sobre de quem seria o problema, sobre onde está o problema: e a questão olhada e refletida por este ângulo, fica fácil responder: o problema está na criança que é singular, diferente, mais inteligente talvez…

Imaginem se disséssemos que o problema esta exatamente neste conchavo que se estabeleceu entre sistemas de ensino e familiares, para o adestramento eficaz das crianças de hoje. Imagine se podemos dizer isso? Mas é o que eu afirmo. O problema não são nossas crianças. Só faltava chegarmos a conclusão de que ser diferente, genial, singular, ter um modo próprio de olhar o mundo, ser inteligente, ter um dom, ser mais sensível, enfim, ser autêntico, se constituísse num problema. Aí alguém pode objetar: mas os diferentes são poucos. E eu digo: diferentes somos todos os que escapamos do processo massacrante de adestramento consentido e patrocinado pela crueldade de adultos que não sabem e não querem aprender a lidar com as singularidades de cada sujeito em formação e desenvolvimento, com as singularidades de cada ser humano.

Não há iguais, somos todos singulares.

Os adultos de amanhã serão filhos das crianças de hoje. Que mundo adulto podemos imaginar então? Quanta tristeza! Ainda bem que uma boa parte destas criança arruma, mesmo encerando a monotonia dos banco escolares, um meio de “fugir” deste sistema. Nestas está nossa esperança de um futuro melhor, porque se formos esperar pelos que são agraciados com as benesses do sistema de adestramento atual, lamentaremos, com muito pesar, nosso futuro. Então…

Artigo publicado na revista VITRINE,  fevereiro de 2012, n. 26, ano 5 – www.revistavitrine.com.br

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Adeus ano novo, (in)feliz homem velho!

foto Gilberto Rodrigues

Vamos já por meados de janeiro. Ressoa ainda em nossos ouvidos o que talvez tenhamos mais escutado por volta de um mês atrás, vésperas das comemorações de natal, da passagem de ano. Escutamos pelos quatro cantos, pois ecoava aos quatro ventos, a expressão de um desejo de que o ano que findava fosse embora o mais rapidamente possível e que o ano vindouro trouxesse perspectivas de que todos os sonhos, planos, desejos e projetos que não se concretizaram ano passado pudessem agora, no ano novo, tornarem-se realidade.

Observa-se então que este é um ritual que se dá a cada ano, todos os anos, sem mudar nada. Em todo final de ano há o desejo de que o ano que finda se vá o mais rápido possível para que o ano novo seja promissor e nele, nossos sonhos se realizem. Mas como sonhos novos e projetos interessantes se realizarão se continuamos a ser os mesmos homens velhos que sempre fomos? Ao não mudarmos condenamos o ano que se inicia à mesmice desinteressante de sempre.

Há algo errado, com certeza nessa equação. Uma fria e desalentadora constatação é de que os pedidos, de que no ano novo fossem realizados os sonhos e os desejos de cada um, não aconteceram. – Ou então poderemos olhar de outro modo: deu sim tudo muito certo, se não tivesse dado estaria tudo muito pior-. Mas por via das dúvidas verificamos, de novo, os ritos de passagem de ano. Lentilhas, romãs, bagos de uva, carne de porco, nozes, avelãs, castanhas e tâmaras, na culinária; calcinhas e cuecas novas, roupa branca, uma peça amarela, lençóis novos para os recém-casados, no vestuário; afora pular sete ondas, dar três pulinhos com uma taça de champanhe na mão sem derramar, etc. E essa lista fica enorme. Mas, ano passado foi assim também. E no outro ano também fora assim. E nos outros, e em todos os outros. Por que então que, ao final de cada ano, tendo feito tudo pra que este ano fosse bom, próspero, com muita sorte e saúde, queremos que ele acabe logo, passe o mais rápido possível, para que então entre o ano novo, e na entrada, de novo, tudo outra vez seja realizado? Sabem por que? Porque cada vez mais valoriza-se somente os rituais que se tornam, a cada ano, vazios, sem sentido e estéreis.

 Há uma pergunta inquieta, que não cala: se tudo é feito conforme recomendações das tradições, dos costumes e das crenças, por que o resultado não corresponde ao empenho e a dedicação fervorosa de cada um? Por que falta algo? Mas o quê? Autenticidade. Quantos cearam com seus familiares ou parentes só porque assim manda a tradição? Quantos não presentearam somente porque este é um costume? Quantos se sujeitaram àquela reunião familiar enfadonha e com as mesmas estórias, por falta de opção? Já repararam como o clima de ano-novo é diferente do clima de natal? Por que será? Porque nas comemorações do ano novo escolhemos com quem vamos compartilhar nossos desejos, nossos sonhos, nossas fantasias enquanto que no natal há obrigações, e quantas obrigações. Do que comer, do valor mínimo do presente, de onde cear, de como se comportar…. Tédio. Vazio. Tristeza, angústia e depressão. Os significados e os conteúdos se perdem nos formalismos e nas aparências…

Se você não estiver disposto a olhar pra você, a se re-conhecer, a ser uma pessoa melhor a cada dia, de nada adiantaram, nem adiantarão, os rituais e as promessas que acabara de fazer. Não são os rituais que estão sem sentido, nem os anos que se repetem, nem são as pessoas que são chatas. Os rituais, os anos, as pessoas são e serão, sempre, reflexos de você.

Se não nos propusermos a nos tornar pessoas melhores, mais compreensivas conosco, com as demandas que fazem as nossas questões, com certeza, daqui a doze meses estaremos torcendo para que este ano que se inicia agora acabe rapidamente. E então estaremos, de novo, torcendo para o novo ano que se inicia e nele vamos depositar, de novo, nossos projetos, nossos sonhos, nosso futuro.

Está na hora de revermos isso para que as festividades natalinas e de ano novo não sejam um conjunto de obrigações, mal cumpridas na maioria das situações, e reveladoras das nossas incapacidades para nos relacionarmos bem e com maturidade, com as pessoas que nos são queridas, importantes e significativas. E isso só será possível quando nos dermos conta de que o futuro somente será melhor quando pudermos dizer uns para os outros, num abraço sincero, enquanto pessoas novas: FELIZ HOMEM NOVO!

Artigo publicado na revista VITRINE, janeiro de 2012, n. 26, ano 3 – www.revistavitrine.com.br

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Sobre o Perdão

foto Gilberto Rodrigues

 

O que é exatamente o perdão?

O perdão é um ato de modificação de um sentido que fora dado a um fato, a uma circunstância  que tenha provocado mágoa, dor, angústia ou uma tristeza profunda. Perdoar é, em última análise, re-significar o passado. Não podemos alterar  os fatos que nos aconteceram no passado, mas podemos, com certeza modificar o seu significado, o seu peso, a sensação de dívida que aquele fato tenho deixado em nós. É verdade sim que os fatos passados são inalteráveis, não podemos desfazer o que fora feito, nem fazer de contas que o  que aconteceu não tenha acontecido. Mas o sentido que nós atribuímos ao que aconteceu, quer tenhamos sido nós a fazê-lo, ou tenhamos sido nós a sofrê-lo, pode ser a alterado, modificado. Ao alterar este fato, estamos perdoando.

Em que situação ele realmente acontece?

Ele acontece quando há uma predisposição, uma vontade, uma determinação, de quem pode perdoar, de assim fazer. O perdão é um ato de maturidade, de caridade. Perdoa quem busca compreender as razões, os motivos daquele que causou, digamos assim, a “ofensa”. Perdoar é um ato de dignidade, não um ato menor, de pequenez, de pessoas rancorosas e que entendem que ainda deve prevalecer a lei do olho por olho, dente por dente. Apenas os fortes perdoam. Os fracos ficam imaginando formas de vingar-se, de descontar, e o que estes não sabem é que só eles padecem com esta atitude e ficam ainda mais pobres. O perdão é um ato que liberta, um gesto que regenera quem perdoa perante si mesmo.

Algumas pessoas dizem que perdoaram, mas não esqueceram. Isso é possível?

Esquecer muitas vezes significa fugir, deixar de encarar o fato que carecia de perdão. O perdão não pressupõe o esquecimento. Costumamos esquecer o que tem pouca ou nenhuma importância. Não podemos imaginar que algo que tenha deixado marcas a ponto de exigir um gesto de perdão seja insignificante, seja sem importância. É importante nos darmos conta de que é muito provável que não tenhamos que esquecer quando perdoamos, mas que nos lembraremos daquilo que fora perdoado com outros olhos, de um outro modo, com um outro significado. Ao perdoar podemos voltar ao convívio. O esquecimento leva ao afastamento pois a cada reencontro a lembrança será ativada, enquanto que no perdão, a presença é possível pois será, após o perdão, re-significada. O passado não foi modificado mas o sentido dado ao que ocorrera é novo. Isto é perdoar. Esquecer é jogar debaixo do tapete, e isto não modifica o sentido de nada, não altera nada, não re-aproxima as pessoas. E aqui reaproximar pode ser visto como reaproximar do outro ou de mim mesmo.

 Quais são os principais benefícios do perdão?

Os principais benefícios do perdão são a paz, a harmonia, a concórdia entre os povos. Sejam estes povos os de uma nação, sejam estes povos os vizinhos de uma rua ou  queles que convivem numa mesma casa. O perdão faz com que a pessoa que perdoou, ao re-significar o que lhe tenha causado dor e sofrimento, ou re-significar a dor e o sofrimento que tenha causado a si mesmo ou a outrem, possa ficar em paz consigo mesma.

 Por que é tão difícil perdoar?

 Porque ainda estamos pouco evoluídos para as relações humanas. Não podemos nos esquecer que ainda há poucos séculos as pessoas falavam muito mais em fazer com que quem cometesse um erro pagasse do que tentar uma compreensão para o que havia acontecido. Perdoar  significa olhar para o outro também, buscar compreender as razões dos desmandos cometidos pelo outro. Não quer dizer aceitação, mas compreensão. O fato de perdoar não significa aceitação ou concordância.

 Fale sobre a re-significação do passado. De que maneira isso ajuda a pessoa a perdoar aos outros e a si mesma?

Re-significar o passado é tentar olhar para o que houve de um outro modo, por um outro ângulo, por uma outra ótica. Isto significa a compreensão de que há outros pontos de vista para se olhar um mesmo fato, uma mesma coisa. Se a pessoa entender que o seu modo de ver o mundo é o único que está certo esta pessoa terá dificuldades para re-significar alguma coisa que lhe tenha causado amargura, dor, sofrimento. Isto ajuda a pessoa a ser mais tolerante e compreensiva com os outros e consigo mesmo. São pessoas que sofrem menos. Ao contrário, aquelas que têm dificuldade de olhar o mundo por um ângulo que possa não ser o seu são pessoas amargas, rancorosas, ranzinzas e normalmente amargam a solidão de conviverem consigo mesmos e com o seu rancor pois se tornam insuportáveis para o convívio. Re-significar o passado só ajuda. Mas é preciso coragem, humildade e determinação para fazer isso. Só os fortes perdoam. Os fracos se escondem atrás da própria covardia e entendem que só eles estão certos. Quem não perdoa vive só.

Alguns especialistas afirmam que o perdão faz bem à saúde. Você concorda com essa afirmação. Por quê?

Sim. Faz muito bem à saúde. Tanto física quanto psíquica. Porque perdoar é livrar-se de um incômodo silencioso e persistente que acompanha aqueles que não perdoam, ao longo da sua vida. Este incômodo faz mal a quem o carrega, a quem o alimenta, a quem o sustenta. Perdoar é livrar-se deste amargor. Seja perdoando ao outro, seja se perdoando. O efeito do perdão é o mesmo, seja para si mesmo, seja para o outro. O passado que precisa ser re-significado não tem dono. Pode ser o meu, o seu  ou o nosso, e carregar rancores por conta de um modo de decifrá-lo é sofrer, é carregar dores que nos impede de ver com olhos livres de amargor, o presente.

 É possível perdoar o outro sem se perdoar?

Entendemos que não. Só quem perdoa pode re-significar o passado, dar um novo sentido a algo que ocorrera e causar dores, amarguras, incômodos e pesares. Como podemos imaginar alguém re-significando algo se não olhar para dentro de si mesmo. Quem perdoa o outro com certeza sabe perdoar-se. Poderíamos dizer o seguinte: quem não sabe se perdoar, não sabe perdoar o outro.

 Perdoar é um exercício?

Sim, perdoar é um exercício. Um exercício que, para aqueles que acreditam no perdão, na nobreza deste gesto, deste ato, desta conduta, deve ser praticado quotidianamente. O mundo em que vivemos hoje está nos colocando o tempo inteiro diante de novos modos de olhar os fenômenos que circunscrevem o nosso dia-a-dia.Mais do que nunca  da coisa pode ser vista de vários modos. As informações disponibilizam novos modos de olhar para as coisas que nos cercam, que nos acontecem. Por isso podemos estar o tempo inteiro sendo requisitados a rever nossos pontos de vista, nossas óticas, a re-significar.

Por que algumas pessoas têm mais facilidade para perdoar que outras?

É importante considerarmos uma coisa. Ainda há muita gente que entende o perdão como um ato fraqueza e não como um gesto de nobreza possível apenas para os fortes. Há fatores culturais, que não dá para abordar neste ocasião, que instigam as pessoas a uma valentia e a uma busca de certeza como significado de ser forte. Além disso somos um povo ainda frágil com relação aos valores que sustentam as relações entre pessoas, a natureza, o mundo. Ainda temos uma parcela significativa da nossa sociedade que vive sob a égide da lei de Gerson. De que o importante é levar vantagem em tudo. É só vermos o noticiário para ver com agem os nossos representantes de modo geral. Ao mesmo tempo ainda se pensa que perdoar é voltar atrás, é ser fraco, é ser bobo quando é exatamente o contrário. Isso quer dizer que ainda devemos falar muito de perdão para que este valor, este fenômeno, genuinamente humano, possa ser visto como algo nobre, que valha a pena. Além disso é importante considerarmos a estrutura psíquica e emocional de cada sujeito. Porque ela também  influencia a maneira ver e de se relacionar com o mundo.  E esta estrutura decorre em parte do nosso processo de formação, da nossa educação para a vida. É necessário ainda considerarmos a necessidade do auto-conhecimento, pois é na maturidade que o perdão pode desabrochar. Há algo que de tão óbvio não damos conta muitas vezes: só enxergamos com os nossos olhos. Sendo assim precisamos cuidar para podermos olhar cada vez melhor o mundo, cuidar de nós mesmos, do nosso modo de olhar. Por estas razões algumas pessoas têm mais dificuldade e outras mais facilidade para falar e praticar o perdão. Você consegue imaginar um troglodita perdoando? Ou aquele que se acha dono das verdades do mundo? Perdoar é para os nobres de alma e de espírito, para aqueles que estão se encaminhando para uma maturidade emocional, para uma nobreza de propósitos, para se tronarem, de fato, seres humanos.

Artigo publicado na revista VITRINE, dezembro 2011, n. 25, ano 3 – www.revistavitrine.com.br

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Entrevista, Tema: Sobre a Paixão

Entrevista concedida à Jornalista Michelle Sampaio

para o programa Vanguarda Comunidade – Exibido em 20/11/2011

Emissora: TV Vanguarda, Taubaté.

Miniatura

Clique aqui para assistir: http://www.youtube.com/watch?v=enMuS9N07Nw

O que é a paixão?
A diferença entre amor e paixão.
O objeto da paixão exige exclusividade.
A relação da paixão com a dor e o prazer.
O que fazer para evitar a paixão.
O mecanismo do apaixonar-se.
O amor decorre do conhecimento, a paixão do desconhecimento.
O apaixonado deixa tudo para viver a sua paixão, e se arrepende depois.
Declamação do Poema MULHER, por Michelle Sampaio.

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O Poeta interiorano

Entrevista concedida a Guilherme Tauil, para o ar.v cultural, jornal cultural, ano 1, edição 02, novembro 2011

Certa vez, Chico Buarque disse que o samba chega ao compositor por caminhos tortuosos. Depois de conhecer a história de Gilberto Rodrigues, pode-se dizer que o mesmo acontece com a poesia. Embora desde muito cedo Gilberto brincasse com as palavras reescrevendo letras das modas de viola que ouvia em Queluzito, interior de Minas  Gerais, foi através de um castigo que descobriu-se poeta.

Mesmo sendo um bom aluno, o então seminarista de dezenove anos de idade não havia estudado para uma prova de literatura portuguesa e foi pego colando. Piedoso, o  padre fez uma proposta a Gilberto, dizendo que estaria disposto a esquecer o ocorrido caso o infrator lhe entregasse, no dia seguinte, um poema que contivesse todos os conceitos formais da matéria. Gilberto aceitou a punição e compôs, assim, seu primeiro poema, que ficaria como uma espécie de hino do seminário, mesmo após sua saída. Desde então, não parou mais de escrever.

Curioso é saber que a infância de Gilberto não sugeriu a formação de um escritor. Embora o conhecimento fosse algo valorizado pelos pais, o aprendizado da leitura só veio aos oito anos e a escola mais próxima ficava a seis quilômetros dali, de modo que não havia livros por perto – exceção feita a um dicionário de medicina popular, escrito pelo doutor Chernoviz num remoto 1842, que o poeta faz questão de guardar até hoje. Gilberto não arrisca dar nome ao fenômeno, mas acredita que o poeta nasça com a vocação. E é preciso desenvolvê-la, pois, para ele, os poetas têm um compromisso com a sociedade: estimulá-la, seja através das emoções ou das inquietudes que os versos provocam.

Gilberto é autor de sete livros, mas só dois foram publicados. O primeiro, “Corpo chão”, de 1982, surgiu de uma maneira inusitada. Formado em Psicologia, Gilberto foi  contratado por uma multinacional para conversar com os trabalhadores que viriam do campo trabalhar como metalúrgicos. Sendo ele também do interior, tinha a percepção de que o mundo industrial era massacrante, e encontrou-se na difícil situação de não poder dizer àqueles homens que aquilo tudo era uma ilusão. O protesto fez-se, então, em forma de poesia. “Corpo chão” é pesado e vai contra o abandono do homem rural e contra a exploração da indústria. Cinco anos depois, publicou “Bolsa das águas”, em que filosofa sobre as descobertas e a vida em geral, baseando-se até em conceitos psicanalíticos.

Quando põe as coisas na balança, Gilberto Rodrigues considera-se um escritor relapso, e, às vezes, nem se apresenta como poeta – pois entende que, para isso, seria  necessário ter o domínio da palavra. E com ele ocorre justamente o contrário: é a palavra que o domina. Assim, o psicólogo dispensa preparações e rituais, porque quando a poesia vem, ela vem sem esforço. E muitas vezes com o primeiro verso já pronto. O poemas não são trabalhados, eles ficam da forma que nascem. Isso porque Gilberto percebeu que, ao tentar reescrevê-los, acabava criando outro texto, distante da emoção que queria passar. Desde então, preferiu não intervir mais em seu processo de criação. Descrente do conceito de inspiração, prefere dizer que sua poesia vem da permissão que dá às pequenas coisas do cotidiano o tocarem. Afinal de contas, a poesia é coletiva, daí a sua capacidade de emocionar a todos e ser atemporal.

Atualmente, Gilberto concilia seu ofício de psicólogo com o de poeta. Seu último projeto chama-se “Carreando histórias” e é todo escrito conforme a fala do homem  interiorano. Além disso, está empenhado em seu novo blog, onde pretende depositar toda sua produção poética e também suas entrevistas e fotografias.

Você pode acompanhá-lo acessando o www.gilbertorodrigues.com

Sobre a Paixão

foto Gilberto Rodrigues

Quando se está apaixonado, homem ou mulher, nenhum é capaz de se imaginar vivendo sem o outro. Mas que fenômeno é este a que chamamos paixão? Que proporciona momentos de ansiedade e expectativas quando está se iniciando, de intensa alegria e prazer quando está acontecendo e de profunda dor e tristeza ao se esfacelar? É provável que exista na vida de cada pessoa pelo menos uma vivência de paixão, além da que aprendemos com nossa primeira, inescapável e necessária vivência de paixão: aquela que tivemos por quem desempenhou para nós a função materna.

Abrir espaço para que novas paixões aconteçam é imaginar-se capaz de um dia poder satisfazer-se plenamente através de alguém, pois, para o apaixonado, o prazer está em poder satisfazer-se através do outro, em imaginar-se capaz de poder completar o outro para que o outro o preencha. Neste sentido, a paixão não é benéfica e nem contribui para o desenvolvimento saudável de seres humanos porque busca suprir através do outro uma falta que o outro não poderá suprir. Ao constatar essa impossibilidade, a paixão acaba e a sensação de incompletude, de vazio, de falta, ressurge. Acaba com a mesma impetuosidade que começara. Até que uma nova paixão aconteça. Seja por pessoas, objetos, coisas, etc. E isto se repete vida inteira.

 A paixão faz com que o sujeito, a pessoa que está apaixonada, sentindo-se preenchida pelo outro faça o possível e tente o impossível para manter este outro ao seu lado, ao seu dispor. Este saber não é no plano da consciência. Esta tentativa é marcada por uma grande intensidade de afetos, onde se busca satisfazer aquele por quem se está  paixonado com todas as suas forças e habilidades tentando garantir assim que o outro não se afaste. O sujeito, masculino ou feminino, acredita ser capaz de preencher, satisfazer plenamente o outro, de suprir todas as necessidades do outro, que com certeza, se ainda não aprendeu que os fascínios da paixão são fugazes, ficará encantado, e apaixonar-se-á também. Desenvolvendo a mesma dinâmica. Imagine então como será bela, quase perfeita, uma relação entre duas pessoas apaixonadas, onde cada qual só se empenhará em satisfazer o outro para se ver satisfeito. Esta busca de satisfazer-se através do outro evolui de tal modo que quem está apaixonado chega a colocar em risco a própria individualidade. É sabido que o termo paixão vem do latim pathos e significa sofrimento. Sofrimento pelo fato de que um ser humano não é capaz de satisfazer plenamente o outro e nem de ser pelo outro satisfeito. Esta realidade o faz confrontar-se com suas impotências e fragilidades, por isso o término de uma paixão é sempre desalentador, sofrido, doloroso. Por isso, poderíamos dizer que se você puder antecipar o momento deste apaixonar-se, se esta possibilidade aparecer a sua frente, e for possível, fuja, pois a possibilidade da paixão é prenúncio de encrenca e muita dor, muita amargura, mesmo que depois de intensos e indescritíveis momentos de prazer. É só uma questão de tempo. E todos que já se apaixonaram um dia sabem do que estou falando.

É difícil saber o que significa estar apaixonado quando se está “dentro” da relação de paixão. Perde-se a sensatez, a capacidade de se posicionar, a partir do que pensa e sente, pois, o apaixonado vive em função de buscar satisfazer o outro, e por medo de ferir um ao outro, muitos casais, apaixonados, se destroem.  Isto porque o apaixonado –
repito – não só busca satisfazer-se plenamente através do outro como busca evitar qualquer situação que o desagrade, ou, imagina, irá entristecer o outro, objeto de sua paixão.

A paixão, enquanto está sendo vivenciada é algo que quem a experimenta não deseja que termine, porém está muito longe do amor, e por isso por mais que nos surpreenda as circunstâncias do apaixonar-se, é bom sabermos que a paixão é algo próprio para os heróis, imbatíveis na realização de suas pretensões e aliados dos deuses. Somos humanos.

Artigo publicado na revista VITRINE, novembro 2011, n. 24, ano 3 – www.revistavitrine.com.br

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