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Sobre a Paixão

foto Gilberto Rodrigues

Quando se está apaixonado, homem ou mulher, nenhum é capaz de se imaginar vivendo sem o outro. Mas que fenômeno é este a que chamamos paixão? Que proporciona momentos de ansiedade e expectativas quando está se iniciando, de intensa alegria e prazer quando está acontecendo e de profunda dor e tristeza ao se esfacelar? É provável que exista na vida de cada pessoa pelo menos uma vivência de paixão, além da que aprendemos com nossa primeira, inescapável e necessária vivência de paixão: aquela que tivemos por quem desempenhou para nós a função materna.

Abrir espaço para que novas paixões aconteçam é imaginar-se capaz de um dia poder satisfazer-se plenamente através de alguém, pois, para o apaixonado, o prazer está em poder satisfazer-se através do outro, em imaginar-se capaz de poder completar o outro para que o outro o preencha. Neste sentido, a paixão não é benéfica e nem contribui para o desenvolvimento saudável de seres humanos porque busca suprir através do outro uma falta que o outro não poderá suprir. Ao constatar essa impossibilidade, a paixão acaba e a sensação de incompletude, de vazio, de falta, ressurge. Acaba com a mesma impetuosidade que começara. Até que uma nova paixão aconteça. Seja por pessoas, objetos, coisas, etc. E isto se repete vida inteira.

 A paixão faz com que o sujeito, a pessoa que está apaixonada, sentindo-se preenchida pelo outro faça o possível e tente o impossível para manter este outro ao seu lado, ao seu dispor. Este saber não é no plano da consciência. Esta tentativa é marcada por uma grande intensidade de afetos, onde se busca satisfazer aquele por quem se está  paixonado com todas as suas forças e habilidades tentando garantir assim que o outro não se afaste. O sujeito, masculino ou feminino, acredita ser capaz de preencher, satisfazer plenamente o outro, de suprir todas as necessidades do outro, que com certeza, se ainda não aprendeu que os fascínios da paixão são fugazes, ficará encantado, e apaixonar-se-á também. Desenvolvendo a mesma dinâmica. Imagine então como será bela, quase perfeita, uma relação entre duas pessoas apaixonadas, onde cada qual só se empenhará em satisfazer o outro para se ver satisfeito. Esta busca de satisfazer-se através do outro evolui de tal modo que quem está apaixonado chega a colocar em risco a própria individualidade. É sabido que o termo paixão vem do latim pathos e significa sofrimento. Sofrimento pelo fato de que um ser humano não é capaz de satisfazer plenamente o outro e nem de ser pelo outro satisfeito. Esta realidade o faz confrontar-se com suas impotências e fragilidades, por isso o término de uma paixão é sempre desalentador, sofrido, doloroso. Por isso, poderíamos dizer que se você puder antecipar o momento deste apaixonar-se, se esta possibilidade aparecer a sua frente, e for possível, fuja, pois a possibilidade da paixão é prenúncio de encrenca e muita dor, muita amargura, mesmo que depois de intensos e indescritíveis momentos de prazer. É só uma questão de tempo. E todos que já se apaixonaram um dia sabem do que estou falando.

É difícil saber o que significa estar apaixonado quando se está “dentro” da relação de paixão. Perde-se a sensatez, a capacidade de se posicionar, a partir do que pensa e sente, pois, o apaixonado vive em função de buscar satisfazer o outro, e por medo de ferir um ao outro, muitos casais, apaixonados, se destroem.  Isto porque o apaixonado –
repito – não só busca satisfazer-se plenamente através do outro como busca evitar qualquer situação que o desagrade, ou, imagina, irá entristecer o outro, objeto de sua paixão.

A paixão, enquanto está sendo vivenciada é algo que quem a experimenta não deseja que termine, porém está muito longe do amor, e por isso por mais que nos surpreenda as circunstâncias do apaixonar-se, é bom sabermos que a paixão é algo próprio para os heróis, imbatíveis na realização de suas pretensões e aliados dos deuses. Somos humanos.

Artigo publicado na revista VITRINE, novembro 2011, n. 24, ano 3 – www.revistavitrine.com.br

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